# devaneios
- Stuart

- 26 de mar. de 2020
- 4 min de leitura
não criei esse blog para encher de coisas que eu escrevo quando a minha cabeça está cheia, mas me pareceu adequado usar o espaço público que tenho para esvaziar. ainda mais sabendo que esse espaço pode e não pode ser acessado, e eu gosto da possibilidade de dividir de forma liberada o que eu penso.
desde muito pequena (talvez com 9/10 anos), eu queria ser alguém que tivesse um impacto na vida dos outros. esse impacto poderia ser por meio do que eu falava, do que eu criava ou do que eu fazia, não importava. eu passava os dias falando sozinha no meu quarto imaginando um futuro utópico em que as pessoas dariam essa atenção para mim e para as minhas ações variadas. talvez isso tenha acontecido porque eu, além de filha única, não tinha muitas crianças com quem brincar. mas também acho que tinha relação com um anseio que ainda carrego de ter a certeza de que existo.
vou explicar melhor essa neura de existir - esse texto é um fluxo de pensamentos mesmo. carrego em mim uma estranha sensação de que eu, a qualquer momento, vou acordar e essa vida da qual me afeiçoei tanto não passa de um sonho. e o mais grave nessa neura é que às vezes sinto que esse sonho nem é meu. alguém está me sonhando e no momento que essa pessoa decidir não me sonhar mais, eu vou desaparecer. e não é nem de morrer que tenho medo, mas essa coisa que seria um desaparecimento total, como minha vida inteira não tivesse acontecido. tudo que eu fiz, os pensamentos que pensei, as palavras que falei, nada disso teria sido real. é a essa sensação a que me refiro sobre não saber se existo ou não.
talvez por isso a minha presença nas rodas de Escritoras Prepotentes de 12 anos tenha acontecido e sido tão forte. o Tumblr era meu lugar favorito em toda a internet e até hoje sou extremamente agradecida por um espaço seguro em que eu pudesse criar. e eu criei tanto, tanta coisa que, sinceramente, tenho vergonha, mas também tanta coisa bonita. eu era alguém que eu mesma não me lembro de ser de verdade. inventei identidades e nomes e idades. inventei uma vida. mas por trás de tanta invenção existia essa vontade sincera de existir. de receber um aceno de cabeça que confirmasse para meu eu tão bobo e inocente e confuso de que SIM KIMBERLY VOCÊ EXISTE AGORA CALA A BOCA E VIVE.
também sempre tive esse medo sobre a vida. o que é viver? acho esse tipo de pergunta difícil de pensar de verdade porque cada pessoa tem sua própria vida e, portanto, seu próprio jeito de encarar o viver. mas mesmo assim, não parece que existe um manual que todo mundo parece seguir sobre como deveríamos viver e seguir nossos dias? eu sei que isso é muito uma ideia de pessoa acostumada a ser a Excluída, apesar de ter abandonado essa persona um tempinho atrás. mas sério, por que viver é tão difícil? por que essa sensação angustiante de que por mais que eu me esforce em fazer coisas e estudar coisas e ler coisas e falar coisas e conhecer lugares e pessoas e tudo isso, nada é o Certo.
tem dias que me pego tendo curiosidades sobre os fatos mais estranhos da vida. umas semanas atrás eu perguntei para uma amiga minha como é que alguém sabe que está apaixonado e ela me disse "ué, você nunca se apaixonou" e eu respondi que obviamente já tinha, mas não sabia se aquilo era mesmo se apaixonar. ela explicou seu modo de se apaixonar e eu perguntei para outras amigas e elas tinham respostas similares sobre sensações e olhares, dos quais eu nada entendia mas continuei balançando a cabeça porque eu queria parecer estar entendendo. e esse é só um exemplo esdrúxulo do que eu imagino ser viver. me perguntei esses dias como as pessoas sabem que estão se divertindo em uma situação, se isso está relacionado com a sensação de conforto que percorre seus corpos ou se está diretamente ligado com o quanto conseguem sorrir deliberadamente por uma quantidade ridícula de tempo. eu não sei como sei que estou me divertindo, apesar de poder usar a mesma descrição das minhas amigas de que existe Uma Sensação que consegue abancar todos esses sentimentos e que não é possível descrever de verdade com palavras de verdade.
eu não sei por que estou falando sobre viver ou sobre confusões. ficar parada no meu quarto me fez perceber que tem coisas que eu faço apenas porque existe um grande dever de Viver e esse dever envolve ganhar dinheiro e ter um emprego e ter uma formação. e apesar de eu gostar de todas essas coisas e de não ter nada a que reclamar sobre como minha vida tem se encaminhado até agora, eu ainda tenho essa vontade de ter minha existência confirmada (estou tentando retomar a ideia inicial do texto, acabei me perdendo no percurso).
então. depois das muitas vontades de ser notada e da minha busca por reconhecimento artístico no tão famoso site Tumblr, ainda sustento em mim um desejo meio doido e incoerente de ser uma escritora que escreve palavras que marcam o tempo tanto quanto as palavras que gosto tanto de ler. e eu sei o quão pretensioso é querer ser igual ao que eu leio e estudo, mas às vezes eu me sinto tão próxima das autoras que eu gosto que me pergunto se, aonde quer que elas estejam (esse é um assunto para outra hora), elas sintam o amor que eu exalo toda vez que penso nelas. ler e estudar livros é a coisa mais doida possível porque em algum momento você esquece o que é ficcional e começa a chamar autoras pelo primeiro nome, como velhas amigas de infância. eu quero que alguém um dia chame meu primeiro nome como se eu fosse sua velha amiga de infância. imagino que a existência dessas autoras tenha alguma ressonância e mesmo que isso tudo seja de fato o sonho de alguém, esse alguém sonhou com pessoas muito talentosas que realmente souberam tocar as pessoas. e tocar as pessoas parece um jeito muito doce de pedir para que elas lembrem de você.





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